Cátedra de São Pedro
Esta festa era celebrada já antes do século IV, para recordar que Pedro estabeleceu a sua sede em Roma. Encontra-se nos calendários mais antigos sob o título deNatale Petri de Cathedra, e com a indicação de que se celebrasse no dia 22 de fevereiro. Com a festa de hoje, quis-se expressar desde os começos a unidade de toda a Igreja, que tem o seu fundamento em Pedro e nos seus sucessores na sede romana.
I. O SENHOR DISSE a Simão Pedro: Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça, e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos1.
O termo cátedra significa materialmente a cadeira em que se sentam os mestres, neste caso os bispos. Mas já os Santos Padres utilizavam a expressão como símbolo da autoridade dos bispos, especialmente da Sede de Pedro, isto é, de Roma. São Cipriano, no século III, dizia: “Confere-se o primado a Pedro para mostrar que a Igreja de Cristo é una e una a Cátedra”, quer dizer, o magistério e o governo. E para sublinhar ainda mais a unidade, acrescentava: “Deus é uno, uno o Senhor, una a Igreja e una a Cátedra fundada por Cristo”2.
Como símbolo de que Pedro tinha estabelecido a sua sede em Roma, o povo romano tinha grande apreço por uma verdadeira cadeira de madeira onde, conforme uma tradição imemorial, o Príncipe dos Apóstolos se tinha sentado. São Dâmaso, no século IV, mandou colocá-la no batistério do Vaticano, construído por ele. Durante muitos séculos esteve bem visível e foi venerada pelos peregrinos de toda a cristandade que iam a Roma. Quando se construiu a atual Basílica de São Pedro, achou-se conveniente guardá-la como relíquia. Hoje, pode-se ver no fundo da ábside, como imagem principal, a chamada “glória de Bernini”, um grande relicário onde se conserva a cadeira do Apóstolo coberta de bronze e ouro; sobre ela, o Espírito Santo irradia a sua assistência.
Entre as festas que se encontram nos calendários anteriores ao século IV, as primeiras da Igreja, conta-se a de hoje, com o título de Natale Petri de Cathedra, ou seja, o dia da instituição do Pontificado de Pedro. Com esta festa, quis-se realçar o episcopado do Príncipe dos Apóstolos, o seu poder hierárquico e o seu magistério na urbe de Roma e em todo o orbe. Se bem que fosse um costume antigo comemorar a sagração dos bispos e o dia da tomada de posse das respectivas dioceses, essas comemorações realizavam-se somente na própria diocese. Somente à de Pedro foi dado o nome de Cátedra, e foi a única que se celebrou, desde os primeiros séculos, em toda a cristandade.
Santo Agostinho, num sermão para a festa deste dia, comenta: “A festividade que hoje celebramos recebeu dos nossos antepassados o nome de Cátedra, com o que se recorda que foi entregue ao primeiro dos Apóstolos a Cátedra do episcopado”3. Para nós, a festa é mais uma ocasião de recordarmos a obediência e o amor que devemos àquele que faz as vezes de Cristo na terra.
II. SABEMOS PELA TRADIÇÃO da Igreja4que Pedro residiu durante algum tempo em Antioquia, a cidade onde os discípulos começaram a chamar-se cristãos5. Nela pregou o Evangelho, e a seguir retornou a Jerusalém, onde algum tempo depois se desencadeou uma sangrenta perseguição: o rei Herodes mandou degolar Tiago e vendo que isso agradava aos judeus, mandou também prender Pedro6.
Libertado por intervenção de um anjo, Pedro abandonou a Palestina, indo para outro lugar7. Os Atos dos Apóstolos não nos dizem para onde foi, mas sabemos pela tradição que se dirigiu para a Cidade Eterna. São Jerônimo afirma que Pedro chegou a Roma no ano segundo do reinado de Cláudio – que corresponde ao ano 43 depois de Cristo – e que ali permaneceu durante vinte e cinco anos, até a morte8. Alguns falam de duas viagens a Roma: uma, depois de partir de Jerusalém; a outra, por volta do ano 49, data em que participou do Concílio de Jerusalém para logo depois retornar a Roma e empreender algumas viagens missionárias.
São Pedro chegou a Roma, centro do mundo naquele tempo, “para que a luz da verdade, revelada para a salvação de todas as nações, se derramasse mais eficazmente da cabeça para todo o corpo do mundo”, afirma São Leão Magno. “Pois, de que raça não havia então homens naquela cidade? Ou que povos podiam ignorar o que Roma ensinasse? Era o lugar apropriado para refutar as teorias da falsa filosofia, para desfazer as loucuras da sabedoria terrena, para destruir a impiedade dos sacrifícios; ali, com suma diligência, tinha-se ido reunindo tudo o que os diferentes erros tinham inventado”9.
O pescador da Galiléia converteu-se assim em alicerce e rocha da Igreja, e estabeleceu a sua sede na Cidade Eterna. Dali anunciou o seu Mestre, como tinha feito na Judéia e na Samaria, na Galiléia e em Antioquia. Da cátedra de Roma governou toda a Igreja, instruiu todos os cristãos e, confirmando a sua pregação, derramou o seu sangue a exemplo do seu Mestre.
O túmulo do Príncipe dos Apóstolos situa-se debaixo do altar da Confissão na Basílica vaticana – conforme afirma unanimemente a tradição, ratificada pelas descobertas arqueológicas –, dando assim a entender, também de um modo material e visível, que Simão Pedro é, por expressa vontade divina, a rocha firme, segura e inamovível, que sustém o edifício da Igreja através dos séculos. No seu magistério e no dos seus sucessores, ressoa de modo infalível a voz de Cristo e, por isso, a nossa fé está firmemente alicerçada.
III. O EVANGELHO DA MISSA traz-nos as palavras com que Jesus, em Cesaréia de Filipe, promete a Pedro e aos seus sucessores o Primado da Igreja: Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do reino dos céus, e tudo quanto ligares na terra será ligado nos céus, e tudo quanto desligares na terra será desligado nos céus10. E Santo Agostinho exclama: “Bendito seja Deus, que mandou exaltar o Apóstolo Pedro sobre a Igreja. É digno honrar este fundamento, por meio do qual é possível escalar o Céu”11.
De Roma, umas vezes pelos seus escritos, outras pessoalmente ou por enviados pessoais, Simão Pedro consola, repreende ou fortalece na fé os cristãos que se espalham já por todas as regiões do Império Romano. Na primeira Leitura da Missa, Pedro dirige-se com certa solenidade aos pastores de diversas igrejas locais da Ásia Menor, exortando-os a cuidar amorosamente daqueles que têm sob os seus cuidados: Apascentai o rebanho de Deus que vos foi confiado, não constrangidos, mas de bom grado, segundo Deus; nem por sórdido lucro, mas com prontidão de ânimo12. São exortações que nos trazem à mente as palavras com que Jesus falava do Bom Pastor13 e as que dirigiu ao Apóstolo depois da Ressurreição: Apascenta os meus cordeiros… Apascenta as minhas ovelhas14.
Esta é a missão confiada pelo Senhor a Pedro e aos seus sucessores: dirigir e cuidar dos outros pastores que regem o rebanho do Senhor, confirmar na fé o Povo de Deus, velar pela pureza da doutrina e dos costumes, interpretar – com a assistência do Espírito Santo – as verdades contidas no depósito da Revelação.Por isso – escreve o Apóstolo na sua segunda Epístola – não cessarei de vos trazer à memória estas coisas, embora estejais instruídos e confirmados na presente verdade. Pois tenho por dever, enquanto habito nesta tenda, manter-vos despertos com as minhas exortações, considerando que em breve verei desarmada a minha tenda, segundo me manifestou Nosso Senhor Jesus Cristo. E procurarei que, mesmo depois da minha partida, possais recordar-vos muitas vezes de todas estas coisas15.
A festa de hoje oferece-nos uma nova oportunidade de manifestarmos a nossa filial adesão aos ensinamentos do Santo Padre, ao seu magistério, e de examinarmos o interesse que pomos em conhecê-los e levá-los à prática.
O amor ao Papa é sinal do nosso amor a Cristo. E este amor e veneração devem manifestar-se na petição diária pela sua pessoa e intenções: Dominus conservet eum et vivificet eum et beatum faciat eum in terra… “O Senhor o conserve e o vivifique e o faça feliz na terra, e não permita que caia nas mãos dos seus inimigos”.
É um amor que deve exprimir-se com maior intensidade em determinados momentos: quando os ataques dos inimigos da Igreja se tornam mais duros, quando as normas morais que o Papa recorda ou precisa suscitam críticas e rebeldias no seio dos próprios católicos, quando por qualquer circunstância nos encontramos mais perto da sua pessoa: “Católico, Apostólico, Romano! – Gosto de que sejas muito romano. E que tenhas desejos de fazer a tua «romaria», «videre Petrum», para ver Pedro”16.
(1) Lc 22, 32; Antífona de entrada da Missa do dia 22 de fevereiro; (2) São Cipriano, Epístola, 43, 5; (3) Santo Agostinho, Sermão 15 sobre os santos; (4) cfr. São Leão Magno, Homilia na festa dos Apóstolos Pedro e Paulo, 82, 5; (5) At 11, 26; (6) At 12, 3; (7) At 12, 17; (8) São Jerônimo,De viris illustribus, 1; (9) São Leão Magno, op. cit., 3-4; (10) Mt 16, 13-19; (11) Santo Agostinho, op. cit.; (12) 1 Pe 5, 2; (13) Jo 10, 1 e segs.; (14) Jo 21, 15-17; (15) 2 Pe 1, 12-15; (16) Josemaría Escrivá, Caminho, n. 520.
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